Dramaturgia autoral
A Lua Das Bruxas - Uma Celebração em 4 Atos
Sinopse : Um monólogo lítero - dramatúrgico inspirado nas tradições espirituais pagãs, na linhagem do teatro ritual, com trilha sonora original ao vivo, sobre o sagrado feminino e o simbolismo da lua e suas relações com as questões universais e atemporais da alma humana.
Ato Primeiro - A Lua Nova (e a Negra)
Cena 1
(Trilha sonora instrumental)
E tudo se renova sob a luz da noite, e a vida veste - se e despe - se de véus, em casta soberania, e os caminhos tornam - se iluminados, como a prata que reluz ainda na forja.
As águas se renovam, e tornam mais uma vez as terras férteis, e a luz do fogo novamente acende e arde renascido, e os ventos de novo trazem novos agouros e destinos.
Tudo é renovado pela nova lua no céu, e sua luz de nobre prata sobre o orvalho das próximas noites é a potência do sagrado cósmico feminino e seu sacro selo de fertilidade plena, tudo e todas as coisas, em todos os mundos abaixo da lua, tornam - se terra fértil e semente dos desígnios das deusas castas, de muitos nomes.
Torne - se quem nasceu para ser.
(Um balé gestual inspirado nas posturas sagradas das tradições espirituais pagãs)
E Que se celebre a ciranda da lua.
Cena 2
(Trilha sonora instrumental)
A lua de agora. Mas desde sempre, dona do meu coração, dama da noite, regente dos fluxos do céu, da Terra, do mar e do chão. Tua luz nasce de novo, e cresce com tudo e todas as coisas.
A Deusa tem muitos nomes, alguns desconhecidos do mundo dos homens, nomes ocultos pela noite, nomes ocultos pelo tempo, ocultos pelo templo, ocultos pela morte.
Todos os nomes da Deusa.
(Recita, com o corpo girando, como num ritual, os nomes de várias deusas de muitos panteões, como Kali, Lilith, Hécate, Brigith, Morrigan, e todos os outros)
Que tudo que cresça na vida de seus devotos sinceros tenha o selo da Deusa de muitos nomes, desde a luz que nos chega do céu, até a luz do fogo que arde do chão.
Este Esbat está selado pela luz do fogo, pela luz da ametista, pelo espelho d'agua, pelo ventre do céu, pelas entranhas da noite, e pela força da vontade divina, e sua prevalência, enquanto houver lua no céu,
Brilha de noite, brilha de dia. O céu é teu, e os corações dos teus devotos aqui na Terra.
Aquela que rege mares e marés, que rege o sangue que escorre das mulheres, que rege a potência do falo, que rege o amor que chega, que rege o amor que vai embora, que faz crescer toda haste de relva, os pêlos dos bichos, que torna úmida as entranhas, que faz brilhar os olhos, que faz deitar no solo, que rege o vôo e a queda dos pássaros, aquela de muitos nomes, casta como as primeiras noites do cosmos, Tu sempre será celebrada no céu e na Terra na bruxaria. Para sempre Esbat.
Celebro e reverencio a deusa de muitos nomes, aquela que foi, aquela que é, e aquela que será por toda a eternidade.
Estou a seus pés como serva, mensageira guardiã.
Que a sua exuberância prevaleça, que a potência da sua plenitude seja soberana em todos os mundos, e através de sua divina autoridade tudo e todas as coisas sigam seu curso natural.
(Trilha sonora instrumental)
Cena 3
Você traz o nascer da lua no meu coração, e a presença da deusa já me faz morada, com seus mistérios da noite primordial, e o poder da divina dama agora me faz a guarda, por sua causa esse nascimento celeste, vestiu de céu escuro meu coração, tornou -se um só com o dia e com a noite, já não há temor no coração quando a noite se torna o sagrado feminino sem véu, e o céu noturno se torna a força que habita o útero do cosmos todo, e faz nascer em nossos corações tudo o que o universo tem para nos ofertar, através da noite da alma, do nascer da deusa nua, de você renascida no meu coração, presença divina, eterna feito a ciranda de todas as luas.
Você moça, que se acha apenas metade, pra mim é feito a lua, que só mostra uma face, mas está inteira no céu.
Que as águas claras desse rio de luz possam desaguar em mim, lavar minha alma, que eu possa nascer de novo nas profundezas dessas águas, e que transborde esse rio e torne fértil toda a terra ao redor, e que nos traga prosperidade e amor esses caminhos sinuosos de rio de luz, que as fadas dos rios nos abençoem, que a mãe d'água dos rios nos cubra com seu manto de ternura e proteção,
Que um dia eu possa olhar nos seus olhos e ver as estrelas do céu mais cintilante, assim como a lua brilha alta nas águas dos rios..
Que cresça com a luz da lua no céu nossas certezas no coração, que nossa vontade cresça alumiando o caminho, que o útero da senhora da luz da lua geste nossos pensamentos, palavras e gestos, que floresçam as sementes com a luz que cresce no céu, que tua divindade manifeste desde teu íntimo até o clarão das estrelas, que cresça teu silêncio, tuas preces e tua devoção.
Que o vento lhe traga tuas respostas nas asas do doce perfume das madeiras, que o vento que balança as folhas lhe acene com amor e acolhimento.
Esta prece está selada pelo clarão do luar, pela dança das marés, pelo fogo do coração devocional.
A senhora que move os mares e as paixões, ordena as safras conforme sua vontade, faz sangrar as fêmeas dos bichos e dos homens.
Reina, reina, reina !
Cena 4
(Tambor)
A lua negra derrama sua potência desde as entranhas escuras do cosmos e de sua escuridão a deusa reina soberana, porque não há dia que não se torne noite, não há vida que não se torne morte, não há deus se não houver deusa.
Que do lodo nasça a flor de lótus, que os espinhos revelem o esplendor imaculado da rosa, que escorra o sangue até a cura, que a magia das deusas escuras renovem os mundos feito um rio correndo sem margens.
Flor do céu, serpente profunda da terra escura e úmida, mulher de bruxaria, eterna donzela da noite escura das almas, os séculos não maculam tua beleza imperatriz, bendito seja o sangue que te escorre das entranhas até o chão, porque ali haverá fertilidade, bendito é o orvalho frio e úmido que cai sobre as folhas, porque vem das entranhas da lua, são das sete luas a luz que clareia teu olhar trovão, é do fogo dos temporais a centelha que arde na tua libido, são das fadas e borboletas a textura dos teus lábios, de excesso das luas o teu beijo, de lua negra ciranda teu silêncio, de um fogo caído do céu em noite de lua escura, de um deus fecundando a terra escura no clarão da lua, nasceu essa flor do céu imaculada e pura, de bruxaria cigana de sangue da deusa e alma de cura.
Ato Quarto - A Lua Que Míngua
Cena 1
Celebro com reverência toda lua minguante, porque é dela a força que puxa para o escuro profundo da terra tudo o que deve cair, sejam folhas mortas, caprichos da vontade, sangria das entranhas das fêmeas, feitiço opositor.
Que todas as senhoras da lua em queda, em quaisquer de seus nomes, reinem sobre o céu de nossas almas pagãs, e deitem sobre a terra fria à sete palmos abaixo, na eterna noite escura do profundo da terra, toda maldição.
Está selada esta prece por todo o orvalho da lua em queda, como um manto de prata do céu, selando os portais dos mundos.
Cena 2
All Hallows Eve – Samhain (pela roda do norte)
Do Livro das Sombras de Casta Diva
Que nossos mortos descansem. O que quer que tenham buscado em vida, que possam encontrar agora na hora da morte. Que a Senhora da Ceifa proceda com seu ofício, e traga renovação para a natureza inteira. Que as fronteiras dos mundos estejam seladas, e seus guardiões em vigília. A Senhora da foice é uma mulher abandonada que nunca vai embora. Que tenham uma boa morte os que partem. Que honrem suas vidas os que ficam. Que as aves da noite da Deusa tragam seus agouros, que seus cantos anunciem os destinos, que seus vôos decretem as sentenças desde o céu. Que a roda gire, que as almas ascendam, e os corpos tombem. Que assim seja porque foi assim no início. Que assim seja porque será assim durante as eras, sem fim.
(Trecho de A Lua Das Bruxas, texto, dramaturgia e trilha sonora original de Marcabru Aiara)
Nesta lua cheia de Wesak, dedico ao meu mestre espiritual minha nova dramaturgia.
Procuro atriz judia, de preferência de linhagem Sefarad (como a minha), com interesse no Iídiche, para encenar esse meu texto.
Procuro atriz de ascendência árabe.
Whatsapp 21 973637891
Sefarad – A Alma Única Da Ibéria
Texto, dramaturgia e trilha sonora original (ao vivo)
Marcabru Aiara
Marcabru Aiara
Sinopse : Uma dramaturgia feito um tratado sobre o transcendental, de caráter místico, teológico, discipular e devocional. Espiritualidade sem religião. O corpo como o templo da alma, e não o cárcere.
Personagens :
Luzia das Almas : Cigana árabe da Espanha
Rosária de Avis : Judia Sefarad Portuguesa
O Andaluz : Cigano Banjara
Rosária de Avis : Judia Sefarad Portuguesa
O Andaluz : Cigano Banjara
Luzia :
A Ibéria é feito uma deusa tríplice, donzela, mãe e anciã. Terra de muitos povos, santos e aldeias, fértil no chão e no imaginário de seus rebentos, mesmo os bastardos. De seu ventre ancestral, trago à luz minha estória, feito um transe de minha alma na noite escura do tempo, como um sol de meio dia dos desertos árabes, nas catacumbas de nosso inconsciente coletivo.
Rosária :
Árabes, judeus, ciganos, somos sua florada temporã, de primaveras, espinhos e jardins de inverno, e ornamos nossas lápides comuns, sob a égide da alma única da Ibéria.
O Andaluz :
A cabala que zela por essa estória reverbera sem nome, sem véus, no âmago de onde nascem as línguas e as religiões, o silêncio e a devoção, distante dos caminhos mundanos. Mas minha mãe esposou os deuses antigos, mais de um como se sabe nos céus, como nas tragédias cosmogônicas de antigas civilizações. E vim desde seu ventre com essa estória na carne, na alma, no verbo e no espírito.
Rosária :
Sefarad é terra mística onde reina a “unidade transcendente das tradições espirituais”,
Luzia :
Lugar de encontro do humano com o divino
Rosária :
Sefarad manifesta a reconciliação da natureza e da cultura, onde as paisagens são arquétipos divinos, onde nos montes elevam-se os espíritos,
O Andaluz :
Aonde nas encruzilhadas encontram-se os destinos,
Luzia :
Onde os anjos voam a céu aberto,
Rosária :
Querube de asas milhares, Sefarad é uma civilização imorredoura, de matriz universalista, em Sefarad o sol está em zênite.
O Andaluz :
Um canto, pois, para Sefarad. De mil estrofes, como seus muitos nomes.
Luzia e Rosária (juntas em uníssono) :
O canto é eterno, e aquela que canta, apenas sua serva.
Luzia :
Serva como Sarah, a negra, que nos conduz desde antes mesmo de seu advento neste mundo, porque a escuridão da noite também é seu manto de mãe sobre nós, de ternura e proteção. Que nossos inimigos não nos vejam, e que haja um eterno eclipse no céu de suas batalhas.
E que seja leve nosso fardo, e nossa caravana. O que se pode levar desta vida, quando a linha riscada em nossas mãos, tem seu fio em desenlace ?
O Andaluz :
Não há morte tão bela quanto a da cigarra. Não sepultam seus corpos de seu último vôo, caídas feito as pétalas no chão, e não de cansaço, mas de vitória. E como o perfume das flores vermelhas, amarelas e corais, o canto da cigarra torna impregnado o verão inteiro de sua presença , e dão testemunho de suas almas, como tudo o que é invisível, mas que não se duvida. E não é tudo uma epifania, desde a luz do poente, até o clarão da lua ?
Rosária :
Freundschaft (amizade), Liebe (amor), Kirch Und Heilge (igreja e santos), Kreuze (cruz), Bilder (imagens), Altar (altar) Und Musik (música). É o que carrego comigo. Uma igreja seja mesquita ou sinagoga, ou a floresta como templo, a cruz de Brigith, ou a cruz ansata, ou do cristo.
O Andaluz :
São muitas vidas, templos e devoções. E se fora Kaiser outrora, ou César ou Califa ou Czar, agora erro no deserto enquanto espero a hora de voltar à Meca, ou subir nas colinas do Lácio e dos lábios de minha outra bisavó pagã, ouvir de novo como se reza.
Rosária :
O primeiro templo é o seu próprio coração, depois o coração do outro. O segundo e o terceiro templos são a vida, e os sítios sagrados da natureza.
O último templo a ser erguido é o de pedra, no mundo. Mas todos eles formam um único templo, se os deuses e deusas os habitam, não sem antes perfurar o coração dos sacerdotes, destronando suas vaidades déspotas e caprichosas.
O velho rabino fez de tudo por ele. A cada impossibilidade que surgia, uma ponderação seguida de uma golada de chá, e uma nova perspectiva descortinada, e o sol que brilha para todos, novamente iluminava o caminho do jovem discípulo.
Se não tinha qualificação para a tarefa, o Rabino lhe propunha um curso. Se não tinha feito suficiente sua parte, dava - lhe um novo prazo, para refazer. Se não conseguia sozinho, lhe auxiliava. Se tinha dúvidas, lhe oferecia novas leituras. Se calava, o velho Rabino zelava por seu silêncio.
Comovido depois de anos, o jovem discípulo perguntou qual o nome disso tudo. Como se chama o nome desse esforço prolongado, incansável, em ajudar alguém, sem violar as leis do espírito no entanto ? Essa paciência em fazer de novo, essa aceitação plena, esse estar junto ainda, mesmo depois de tanta dificuldade.
O Rabino não respondeu diretamente mas no coração do jovem discípulo nasceu uma nobre virtude divina : a misericórdia.
O Rabino não respondeu diretamente mas no coração do jovem discípulo nasceu uma nobre virtude divina : a misericórdia.
Essa estória o cigano Andaluz contava sempre em Iídiche, para si mesmo, se ninguém o compreendia.
Luzia :
Não abandone seu caminho, nem o seu destino. Torne -se quem nasceu para ser. Há muitos cantares belíssimos para seu regresso, flores de júbilo para festejar teu retorno, e o olhar silencioso de um arcanjo que nunca deixou de zelar por ti.
Quando a alma reencontra seu caminho, um arrebatamento súbito faz brotar novas sementes, as fêmeas todas fazem seus partos, mais um cacho no cabelo do teu filho se enrola, uma nascente d'água deixa - se encontrar, uma clareira na floresta torna -se templo de novo, alguma cura é alcançada, um deus encarna na terra e caminha como homem, mulher ou criança, entre a humanidade.
(Trecho de Sefarad - A Alma Única Da Ibéria, de Marcabru Aiara)
Faca de Dois Gumes
Arquétipos Femininos de Amor e Luta
Texto, dramaturgia e trilha sonora original de Marcabru Aiara
Sinopse : Um manifesto poético sobre os arquétipos femininos de amor e luta, universais e atemporais. O amor também é luta, e toda luta, por qualquer que seja a causa, é por amor.
Personagens : Anciã e Donzela
Que a força que habita no útero seja a nossa força, seja a nossa justa medida, seja nosso abrigo, seja esse poder que pulsa no profundo escuro de cada uma de nós.
Anciã :
Maria Madalena
Donzela :
Francisca Gonzaga, Fridda Khalo, Nise da Silveira
Anciã :
Joana D’Arc
Donzela :
Maria da Penha, Chica da Silva, Maria Bunita e Dadá
Anciã : E todas as bruxas do passado, do presente e do futuro com nosso eterno sagrado feminino...
Donzela : E todas as santas, virgens e castas de todas as tradições espirituais dos quatro cantos do mundo
Anciã : E todas as putas, malditas e vilãs de todas as estórias, contadas ou mal contadas, e cada fêmea dos bichos que lambem e lutam por suas crias, enfrentando a vida, enfrentando a morte; E o que é a morte, senão uma dama velha como a noite, invicta e convicta de sua própria força e poder ?
Donzela : Essa estória está em cada lar, em cada vila, nos nobres palácios de qualquer reinado, nas favelas e guetos, nas altas burguesias trans-nacionais, nos quartos de despejo e pensão, nas igrejas e monastérios, nas ruas, na vida.
Anciã : Essa estória nunca deixou de ser contada, por eras e eras.
Donzela : É a estória de cada uma de nós, que em humilde anonimato, estamos em luta pela posse de nosso próprio corpo, pelo direito de escolher a semente que fecundará o escuro fértil de nossas entranhas, somos todas camponesas, desde o nosso próprio corpo até a exuberância dos campos férteis da terra inteira, essa grande mãe de tudo e todas as coisas.
São meus próprios dedos que me tornam mulher, que me adentram como um falo potente, que tornam úmidas minhas entranhas, que me arregaçam as próprias pernas, que tocam suaves minha tez mais íntima e que penetram profundo também no meu escuro fértil, a morada divina de Vênus em mim.
Anciã : Essa é a estória das tecelãs, fiandeiras, parteiras, curandeiras, seringueiras, e nossos sagrados ofícios, que de mãe pra filha, de mestra pra discípula, tornam a terra um lugar mais próspero, trazem fartura e abundância para vossas vidas, de todas as vidas.
Donzela : É a estória de cada mulher da floresta, de cada mulher da senzala, da favela, da ciência, da política, do lar, do baixo meretrício, da linhagem decadente de velhas dinastias.
O sangue da mulher foi derramado pelo direito ao voto, pelo direito ao pão, e em muitas outras batalhas.
O sangue da mulher foi derramado pelo direito ao voto, pelo direito ao pão, e em muitas outras batalhas.
Anciã : Em todas as lutas, com todas as armas, nos dois hemisférios, desde a antiguidade.
Donzela : Não há futuro fora do ventre, literalmente.
Anciã : Não há vitória sem luta. Se há uma vontade, há um caminho.
Donzela : E o amor também é luta, derramamos nosso sangue nas guerras mas também no parto, derramamos nossas lágrimas no parto mas também no amor, derramamos nosso gozo no amor, derramamos nosso sangue quando o cabaço se rompe, derramamos nosso gozo e nosso sangue :
Esse vermelho dos teus lábios já exibe toda a luxúria, alumia meu amor de bicho até que depois de te beijar por um instante tudo se tornou seus lábios, suas coxas, seus seios, e eis que encontro entre suas pernas, úmida de sagrada libido, outros lábios rubros de tanto querer de amor,
Então no seu olhar de águas claras, de amor de fada, de verde erva que colore os campos,
Agora beijando os lábios entre suas pernas, vermelho de toda luxúria, seu olhar era de mar em êxtase , rio escorrendo além da beira, Ela se derramando inteira feito feiticeira , feito fêmea donzela princesa, Me recebendo inteiro dentro dela como a terra tão fêmea se arregaça pra foice sementeira, Era minha chuva sagrada feito lágrimas de amor e porra de uma orgia inteira dentro dela feito amazonas feito toda mulher que morre de amor mesmo que viva como guerreira.
Estou bordando com a linha mais grossa o nosso encontro. Bordando com as próprias mãos, herança das avós, das tardes melancólicas de nossa pequena casa, de nossa pequena vila, nosso pequeno logradouro.
São pontos desenhando as palavras, tramas tecendo os sentimentos, remendos no coração, nessas horas desmanchando tudo, trocando de agulha, de linha, de cor, começo de novo. Os rasgos na alma deixarei assim mesmo.
Meu ofício é tear, tanto o que digo quanto o que penso e sinto. Atar nossos corpos na hora do gozo, mas com a linha mais tênue, feito uma viúva negra que devora o macho depois da cópula.
Eu vou abraçar a sua barriga imensa como quem abraça o mundo, seu mundo novo, e os seus seios vão se encher de leite pra desmamar seu bezerro, tanta fartura no teu seio para saciar sua fome, seu amor de filhote, esse agarro de ternura em teu colo, esse amor de tudo te mamando, às vezes ele aperta com os lábios seu mamilo, viu ? Mas você nem vai ralhar com ele...
E você vai estar linda com aquela barriga imensa, uma lindeza de fêmea toda prenha, os olhinhos brilhando tanto que vai alumiar o teu céu acima, teu chão abaixo que nem labareda, teu horizonte feito uma farol para quem espera no mar um resgate.
Tua beleza de mulher vai explodir feito um sol novo nascendo no cosmos.
Você vai dormir de lado, vai dormir de costas, vai dormir pouco, vai dormir na rede, vai querer dormir mais um pouco, vai querer dormir.
E você parir de cócoras feito uma índia, parir na água feito as mães d'água, vai sentir as dores mais lindas do mundo, as dores do parto. Vai abraçá - lo pela primeira vez em sangue e lágrimas, teu rebento, te lambuzar nele todo, vai comer sua própria placenta, vai dilatar tua buceta pra descer do céu tua vida de novo, teu novo sorriso, tua nova alegria, tua nova identidade, exaltando tua divindade fêmea, toda mãe é um cosmos, um rio de três margens, um mar da Bíblia.
Eu vou abraçar tua barriga imensa, a casa da tua borboletinha, o casulo do teu voar infinito, feito um chapéu da lua.
Me sinto livre entre os loucos, entre os encarcerados, os proscritos, me sinto bem entre os malditos, entre aqueles sobre quem recaem as maldições hereditárias, tenho uma empatia profunda pelos que perderam tudo, por quem nunca conheceu o próprio pai, ou por quem perdeu a mãe ainda cedo, e ama os bichos como se fossem sua própria família de sangue.
(Trilha sonora)
Entre os loucos o meu inferno é colorido, entre suas cabeças ocas e suas línguas enroladas de Gardenal, dentro de seus irritamentos internos, suas irritâncias, suas bocas tortas, suas retinas feito as janelas embaçadas de almas em tormento, entre os loucos o meu cantar é de alguma esperança, às vezes o meu andar é fúnebre e arrastado feito um deles, às vezes o meu delírio é tamanho que tenho medo de mim mesma, e minha dor muitas e muitas vezes é inconsolável, que só com um corte profundo na minha carne, somente com minha integridade física mutilada, só fazendo escorrer meu próprio sangue com um talho nas veias é que esqueço do que não pode ser esquecido, como uma dor escrita na alma com um fogo eterno da danação, um cárcere privado em mim.
(Trilha sonora)
A catarse é um valão a céu aberto, uma fratura exposta de nossas frustrações, é quando a gente acorda só pra cuspir e deita de novo mas não dorme, uma cova rasa com as aves negras famintas pelos nossos restos, uma ferida que o cão não lambe, um medo de altura só por estar de pé, por isso rastejamos para não cair, a catarse é teu lixão, teu esgoto pessoal, tua morbidez, tuas derrotas obesas, um ataúde na tua justa medida, teu cofre de misérias arrombado.
E eu tenho muito medo da delinquência acadêmica dos psiquiatras. As psicólogas me são indiferentes, com suas doces ignorâncias. E da ciência tenho traumas horríveis, tenho cicatrizes com nome e sobrenome de suas autorias, a autoridade médica na maioria das vezes é uma invasão de território. Uma arma química de destruição em massa, sobre a horda alucinada dos loucos e alienados. O fármaco é a moeda do psiquiatra. O surto é sua banca de negócios. O louco é uma margem de lucro para os escravocratas.
(Trilha sonora)
Mas a loucura não é nada romântica, são dezessete facadas na própria barriga para ostentar o sofrimento, uma escrita em garranchos analfabetos no próprio corpo com sangue e perplexidade, um poema ogro sobre sua dor.
(Trilha sonora)
Flores raras da morte, que nascem quando morre alguém no seu coração, ou quando todos os amores morrem no seu coração, quando morre toda forma de vida numa terra, um holocausto num pedaço de chão, um pedaço de pão que se nega, uma mendiga velha e louca que você quase se torna, quando não sobra nada nem mesmo uma migalha miserável, nascem assim as flores raras da morte, nascem tortas, entregues, quase uma hoste de espinhos e pétalas estranhas, flores raras da morte nascem nos hospícios, nos manicômios, no seio das famílias, flores raras da morte exalam seus odores que não são perfumes e intrigam as almas nunca distraídas.
A loucura nasce como uma flor rara da morte, cujas raízes, deitam - se entranhadas pela sua alma feito mármore lápide.
Um Dante preso no inferno mais abissal, não o Dante da Divina Comédia inteira, mas o Dante só do inferno, escrito por suas próprias mãos, um sofrimento na alma que cava um abismo profundo entre você e seu próprio corpo, um inferno Dantesco, um monstro épico no espelho do banheiro, um Fausto habitando também na sua co - morbidade, uma insanidade às claras na sala de jantar, na sala de aula, na sala de espera da consulta, um corpo para ser expurgado do seu sofrimento interior, uma paisagem de dor infinita, sem água potável.
(Trecho de Os Cárceres, texto, dramaturgia e trilha sonora original de Marcabru Aiara)
Bom dia, outro texto autoral.
Att
Marcabrü Aiara
21973637891
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De: Marcabru Aiara Marcabru<marcabruaiara@gmail.com>
Date: ter, 9 de jul de 2019 10:13 AM
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To: Marcabru Aiara Marcabru <marcabruaiara@gmail.com>
De: Marcabru Aiara Marcabru<marcabruaiara@gmail.com>
Date: ter, 9 de jul de 2019 10:13 AM
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To: Marcabru Aiara Marcabru <marcabruaiara@gmail.com>
A Lua Das Bruxas - Uma Celebração em 4 Atos
Sinopse : Um monólogo lítero - dramatúrgico inspirado nas tradições espirituais pagãs, na linhagem do teatro ritual, com trilha sonora original ao vivo, sobre o sagrado feminino e o simbolismo da lua e suas relações com as questões universais e atemporais da alma humana.
Ato Primeiro - A Lua Nova (e a Negra)
Cena 1
(Trilha sonora instrumental)
E tudo se renova sob a luz da noite, e a vida veste - se e despe - se de véus, em casta soberania, e os caminhos tornam - se iluminados, como a prata que reluz ainda na forja.
As águas se renovam, e tornam mais uma vez as terras férteis, e a luz do fogo novamente acende e arde renascido, e os ventos de novo trazem novos agouros e destinos.
Tudo é renovado pela nova lua no céu, e sua luz de nobre prata sobre o orvalho das próximas noites é a potência do sagrado cósmico feminino e seu sacro selo de fertilidade plena, tudo e todas as coisas, em todos os mundos abaixo da lua, tornam - se terra fértil e semente dos desígnios das deusas castas, de muitos nomes.
Torne - se quem nasceu para ser.
(Um balé gestual inspirado nas posturas sagradas das tradições espirituais pagãs)
E Que se celebre a ciranda da lua.
Cena 2
(Trilha sonora instrumental)
A lua de agora. Mas desde sempre, dona do meu coração, dama da noite, regente dos fluxos do céu, da Terra, do mar e do chão. Tua luz nasce de novo, e cresce com tudo e todas as coisas.
A Deusa tem muitos nomes, alguns desconhecidos do mundo dos homens, nomes ocultos pela noite, nomes ocultos pelo tempo, ocultos pelo templo, ocultos pela morte.
Todos os nomes da Deusa.
(Recita, com o corpo girando, como num ritual, os nomes de várias deusas de muitos panteões, como Kali, Lilith, Hécate, Brigith, Morrigan, e todos os outros)
Que tudo que cresça na vida de seus devotos sinceros tenha o selo da Deusa de muitos nomes, desde a luz que nos chega do céu, até a luz do fogo que arde do chão.
Este Esbat está selado pela luz do fogo, pela luz da ametista, pelo espelho d'agua, pelo ventre do céu, pelas entranhas da noite, e pela força da vontade divina, e sua prevalência, enquanto houver lua no céu,
Brilha de noite, brilha de dia. O céu é teu, e os corações dos teus devotos aqui na Terra.
Aquela que rege mares e marés, que rege o sangue que escorre das mulheres, que rege a potência do falo, que rege o amor que chega, que rege o amor que vai embora, que faz crescer toda haste de relva, os pêlos dos bichos, que torna úmida as entranhas, que faz brilhar os olhos, que faz deitar no solo, que rege o vôo e a queda dos pássaros, aquela de muitos nomes, casta como as primeiras noites do cosmos, Tu sempre será celebrada no céu e na Terra na bruxaria. Para sempre Esbat.
Celebro e reverencio a deusa de muitos nomes, aquela que foi, aquela que é, e aquela que será por toda a eternidade.
Estou a seus pés como serva, mensageira guardiã.
Que a sua exuberância prevaleça, que a potência da sua plenitude seja soberana em todos os mundos, e através de sua divina autoridade tudo e todas as coisas sigam seu curso natural.
(Trilha sonora instrumental)
Cena 3
Você traz o nascer da lua no meu coração, e a presença da deusa já me faz morada, com seus mistérios da noite primordial, e o poder da divina dama agora me faz a guarda, por sua causa esse nascimento celeste, vestiu de céu escuro meu coração, tornou -se um só com o dia e com a noite, já não há temor no coração quando a noite se torna o sagrado feminino sem véu, e o céu noturno se torna a força que habita o útero do cosmos todo, e faz nascer em nossos corações tudo o que o universo tem para nos ofertar, através da noite da alma, do nascer da deusa nua, de você renascida no meu coração, presença divina, eterna feito a ciranda de todas as luas.
Você moça, que se acha apenas metade, pra mim é feito a lua, que só mostra uma face, mas está inteira no céu.
Que as águas claras desse rio de luz possam desaguar em mim, lavar minha alma, que eu possa nascer de novo nas profundezas dessas águas, e que transborde esse rio e torne fértil toda a terra ao redor, e que nos traga prosperidade e amor esses caminhos sinuosos de rio de luz, que as fadas dos rios nos abençoem, que a mãe d'água dos rios nos cubra com seu manto de ternura e proteção,
Que um dia eu possa olhar nos seus olhos e ver as estrelas do céu mais cintilante, assim como a lua brilha alta nas águas dos rios..
Que cresça com a luz da lua no céu nossas certezas no coração, que nossa vontade cresça alumiando o caminho, que o útero da senhora da luz da lua geste nossos pensamentos, palavras e gestos, que floresçam as sementes com a luz que cresce no céu, que tua divindade manifeste desde teu íntimo até o clarão das estrelas, que cresça teu silêncio, tuas preces e tua devoção.
Que o vento lhe traga tuas respostas nas asas do doce perfume das madeiras, que o vento que balança as folhas lhe acene com amor e acolhimento.
Esta prece está selada pelo clarão do luar, pela dança das marés, pelo fogo do coração devocional.
A senhora que move os mares e as paixões, ordena as safras conforme sua vontade, faz sangrar as fêmeas dos bichos e dos homens.
Reina, reina, reina !
Cena 4
(Tambor)
A lua negra derrama sua potência desde as entranhas escuras do cosmos e de sua escuridão a deusa reina soberana, porque não há dia que não se torne noite, não há vida que não se torne morte, não há deus se não houver deusa.
Que do lodo nasça a flor de lótus, que os espinhos revelem o esplendor imaculado da rosa, que escorra o sangue até a cura, que a magia das deusas escuras renovem os mundos feito um rio correndo sem margens.
Flor do céu, serpente profunda da terra escura e úmida, mulher de bruxaria, eterna donzela da noite escura das almas, os séculos não maculam tua beleza imperatriz, bendito seja o sangue que te escorre das entranhas até o chão, porque ali haverá fertilidade, bendito é o orvalho frio e úmido que cai sobre as folhas, porque vem das entranhas da lua, são das sete luas a luz que clareia teu olhar trovão, é do fogo dos temporais a centelha que arde na tua libido, são das fadas e borboletas a textura dos teus lábios, de excesso das luas o teu beijo, de lua negra ciranda teu silêncio, de um fogo caído do céu em noite de lua escura, de um deus fecundando a terra escura no clarão da lua, nasceu essa flor do céu imaculada e pura, de bruxaria cigana de sangue da deusa e alma de cura.
Ato Quarto - A Lua Que Míngua
Cena 1
Celebro com reverência toda lua minguante, porque é dela a força que puxa para o escuro profundo da terra tudo o que deve cair, sejam folhas mortas, caprichos da vontade, sangria das entranhas das fêmeas, feitiço opositor.
Que todas as senhoras da lua em queda, em quaisquer de seus nomes, reinem sobre o céu de nossas almas pagãs, e deitem sobre a terra fria à sete palmos abaixo, na eterna noite escura do profundo da terra, toda maldição.
Está selada esta prece por todo o orvalho da lua em queda, como um manto de prata do céu, selando os portais dos mundos.
Cena 2
All Hallows Eve – Samhain (pela roda do norte)
Do Livro das Sombras de Casta Diva
Que nossos mortos descansem. O que quer que tenham buscado em vida, que possam encontrar agora na hora da morte. Que a Senhora da Ceifa proceda com seu ofício, e traga renovação para a natureza inteira. Que as fronteiras dos mundos estejam seladas, e seus guardiões em vigília. A Senhora da foice é uma mulher abandonada que nunca vai embora. Que tenham uma boa morte os que partem. Que honrem suas vidas os que ficam. Que as aves da noite da Deusa tragam seus agouros, que seus cantos anunciem os destinos, que seus vôos decretem as sentenças desde o céu. Que a roda gire, que as almas ascendam, e os corpos tombem. Que assim seja porque foi assim no início. Que assim seja porque será assim durante as eras, sem fim.
(Trecho de A Lua Das Bruxas, texto, dramaturgia e trilha sonora original de Marcabru Aiara)
Nesta lua cheia de Wesak, dedico ao meu mestre espiritual minha nova dramaturgia.
Procuro atriz judia, de preferência de linhagem Sefarad (como a minha), com interesse no Iídiche, para encenar esse meu texto.
Procuro atriz de ascendência árabe.
Whatsapp 21 973637891
Sefarad – A Alma Única Da Ibéria
Texto, dramaturgia e trilha sonora original (ao vivo)
Marcabru Aiara
Marcabru Aiara
Sinopse : Uma dramaturgia feito um tratado sobre o transcendental, de caráter místico, teológico, discipular e devocional. Espiritualidade sem religião. O corpo como o templo da alma, e não o cárcere.
Personagens :
Luzia das Almas : Cigana árabe da Espanha
Rosária de Avis : Judia Sefarad Portuguesa
O Andaluz : Cigano Banjara
Rosária de Avis : Judia Sefarad Portuguesa
O Andaluz : Cigano Banjara
Luzia :
A Ibéria é feito uma deusa tríplice, donzela, mãe e anciã. Terra de muitos povos, santos e aldeias, fértil no chão e no imaginário de seus rebentos, mesmo os bastardos. De seu ventre ancestral, trago à luz minha estória, feito um transe de minha alma na noite escura do tempo, como um sol de meio dia dos desertos árabes, nas catacumbas de nosso inconsciente coletivo.
Rosária :
Árabes, judeus, ciganos, somos sua florada temporã, de primaveras, espinhos e jardins de inverno, e ornamos nossas lápides comuns, sob a égide da alma única da Ibéria.
O Andaluz :
A cabala que zela por essa estória reverbera sem nome, sem véus, no âmago de onde nascem as línguas e as religiões, o silêncio e a devoção, distante dos caminhos mundanos. Mas minha mãe esposou os deuses antigos, mais de um como se sabe nos céus, como nas tragédias cosmogônicas de antigas civilizações. E vim desde seu ventre com essa estória na carne, na alma, no verbo e no espírito.
Rosária :
Sefarad é terra mística onde reina a “unidade transcendente das tradições espirituais”,
Luzia :
Lugar de encontro do humano com o divino
Rosária :
Sefarad manifesta a reconciliação da natureza e da cultura, onde as paisagens são arquétipos divinos, onde nos montes elevam-se os espíritos,
O Andaluz :
Aonde nas encruzilhadas encontram-se os destinos,
Luzia :
Onde os anjos voam a céu aberto,
Rosária :
Querube de asas milhares, Sefarad é uma civilização imorredoura, de matriz universalista, em Sefarad o sol está em zênite.
O Andaluz :
Um canto, pois, para Sefarad. De mil estrofes, como seus muitos nomes.
Luzia e Rosária (juntas em uníssono) :
O canto é eterno, e aquela que canta, apenas sua serva.
Luzia :
Serva como Sarah, a negra, que nos conduz desde antes mesmo de seu advento neste mundo, porque a escuridão da noite também é seu manto de mãe sobre nós, de ternura e proteção. Que nossos inimigos não nos vejam, e que haja um eterno eclipse no céu de suas batalhas.
E que seja leve nosso fardo, e nossa caravana. O que se pode levar desta vida, quando a linha riscada em nossas mãos, tem seu fio em desenlace ?
O Andaluz :
Não há morte tão bela quanto a da cigarra. Não sepultam seus corpos de seu último vôo, caídas feito as pétalas no chão, e não de cansaço, mas de vitória. E como o perfume das flores vermelhas, amarelas e corais, o canto da cigarra torna impregnado o verão inteiro de sua presença , e dão testemunho de suas almas, como tudo o que é invisível, mas que não se duvida. E não é tudo uma epifania, desde a luz do poente, até o clarão da lua ?
Rosária :
Freundschaft (amizade), Liebe (amor), Kirch Und Heilge (igreja e santos), Kreuze (cruz), Bilder (imagens), Altar (altar) Und Musik (música). É o que carrego comigo. Uma igreja seja mesquita ou sinagoga, ou a floresta como templo, a cruz de Brigith, ou a cruz ansata, ou do cristo.
O Andaluz :
São muitas vidas, templos e devoções. E se fora Kaiser outrora, ou César ou Califa ou Czar, agora erro no deserto enquanto espero a hora de voltar à Meca, ou subir nas colinas do Lácio e dos lábios de minha outra bisavó pagã, ouvir de novo como se reza.
Rosária :
O primeiro templo é o seu próprio coração, depois o coração do outro. O segundo e o terceiro templos são a vida, e os sítios sagrados da natureza.
O último templo a ser erguido é o de pedra, no mundo. Mas todos eles formam um único templo, se os deuses e deusas os habitam, não sem antes perfurar o coração dos sacerdotes, destronando suas vaidades déspotas e caprichosas.
O velho rabino fez de tudo por ele. A cada impossibilidade que surgia, uma ponderação seguida de uma golada de chá, e uma nova perspectiva descortinada, e o sol que brilha para todos, novamente iluminava o caminho do jovem discípulo.
Se não tinha qualificação para a tarefa, o Rabino lhe propunha um curso. Se não tinha feito suficiente sua parte, dava - lhe um novo prazo, para refazer. Se não conseguia sozinho, lhe auxiliava. Se tinha dúvidas, lhe oferecia novas leituras. Se calava, o velho Rabino zelava por seu silêncio.
Comovido depois de anos, o jovem discípulo perguntou qual o nome disso tudo. Como se chama o nome desse esforço prolongado, incansável, em ajudar alguém, sem violar as leis do espírito no entanto ? Essa paciência em fazer de novo, essa aceitação plena, esse estar junto ainda, mesmo depois de tanta dificuldade.
O Rabino não respondeu diretamente mas no coração do jovem discípulo nasceu uma nobre virtude divina : a misericórdia.
O Rabino não respondeu diretamente mas no coração do jovem discípulo nasceu uma nobre virtude divina : a misericórdia.
Essa estória o cigano Andaluz contava sempre em Iídiche, para si mesmo, se ninguém o compreendia.
Luzia :
Não abandone seu caminho, nem o seu destino. Torne -se quem nasceu para ser. Há muitos cantares belíssimos para seu regresso, flores de júbilo para festejar teu retorno, e o olhar silencioso de um arcanjo que nunca deixou de zelar por ti.
Quando a alma reencontra seu caminho, um arrebatamento súbito faz brotar novas sementes, as fêmeas todas fazem seus partos, mais um cacho no cabelo do teu filho se enrola, uma nascente d'água deixa - se encontrar, uma clareira na floresta torna -se templo de novo, alguma cura é alcançada, um deus encarna na terra e caminha como homem, mulher ou criança, entre a humanidade.
(Trecho de Sefarad - A Alma Única Da Ibéria, de Marcabru Aiara)
Faca de Dois Gumes
Arquétipos Femininos de Amor e Luta
Texto, dramaturgia e trilha sonora original de Marcabru Aiara
Sinopse : Um manifesto poético sobre os arquétipos femininos de amor e luta, universais e atemporais. O amor também é luta, e toda luta, por qualquer que seja a causa, é por amor.
Personagens : Anciã e Donzela
Que a força que habita no útero seja a nossa força, seja a nossa justa medida, seja nosso abrigo, seja esse poder que pulsa no profundo escuro de cada uma de nós.
Anciã :
Maria Madalena
Donzela :
Francisca Gonzaga, Fridda Khalo, Nise da Silveira
Anciã :
Joana D’Arc
Donzela :
Maria da Penha, Chica da Silva, Maria Bunita e Dadá
Anciã : E todas as bruxas do passado, do presente e do futuro com nosso eterno sagrado feminino...
Donzela : E todas as santas, virgens e castas de todas as tradições espirituais dos quatro cantos do mundo
Anciã : E todas as putas, malditas e vilãs de todas as estórias, contadas ou mal contadas, e cada fêmea dos bichos que lambem e lutam por suas crias, enfrentando a vida, enfrentando a morte; E o que é a morte, senão uma dama velha como a noite, invicta e convicta de sua própria força e poder ?
Donzela : Essa estória está em cada lar, em cada vila, nos nobres palácios de qualquer reinado, nas favelas e guetos, nas altas burguesias trans-nacionais, nos quartos de despejo e pensão, nas igrejas e monastérios, nas ruas, na vida.
Anciã : Essa estória nunca deixou de ser contada, por eras e eras.
Donzela : É a estória de cada uma de nós, que em humilde anonimato, estamos em luta pela posse de nosso próprio corpo, pelo direito de escolher a semente que fecundará o escuro fértil de nossas entranhas, somos todas camponesas, desde o nosso próprio corpo até a exuberância dos campos férteis da terra inteira, essa grande mãe de tudo e todas as coisas.
São meus próprios dedos que me tornam mulher, que me adentram como um falo potente, que tornam úmidas minhas entranhas, que me arregaçam as próprias pernas, que tocam suaves minha tez mais íntima e que penetram profundo também no meu escuro fértil, a morada divina de Vênus em mim.
Anciã : Essa é a estória das tecelãs, fiandeiras, parteiras, curandeiras, seringueiras, e nossos sagrados ofícios, que de mãe pra filha, de mestra pra discípula, tornam a terra um lugar mais próspero, trazem fartura e abundância para vossas vidas, de todas as vidas.
Donzela : É a estória de cada mulher da floresta, de cada mulher da senzala, da favela, da ciência, da política, do lar, do baixo meretrício, da linhagem decadente de velhas dinastias.
O sangue da mulher foi derramado pelo direito ao voto, pelo direito ao pão, e em muitas outras batalhas.
O sangue da mulher foi derramado pelo direito ao voto, pelo direito ao pão, e em muitas outras batalhas.
Anciã : Em todas as lutas, com todas as armas, nos dois hemisférios, desde a antiguidade.
Donzela : Não há futuro fora do ventre, literalmente.
Anciã : Não há vitória sem luta. Se há uma vontade, há um caminho.
Donzela : E o amor também é luta, derramamos nosso sangue nas guerras mas também no parto, derramamos nossas lágrimas no parto mas também no amor, derramamos nosso gozo no amor, derramamos nosso sangue quando o cabaço se rompe, derramamos nosso gozo e nosso sangue :
Esse vermelho dos teus lábios já exibe toda a luxúria, alumia meu amor de bicho até que depois de te beijar por um instante tudo se tornou seus lábios, suas coxas, seus seios, e eis que encontro entre suas pernas, úmida de sagrada libido, outros lábios rubros de tanto querer de amor,
Então no seu olhar de águas claras, de amor de fada, de verde erva que colore os campos,
Agora beijando os lábios entre suas pernas, vermelho de toda luxúria, seu olhar era de mar em êxtase , rio escorrendo além da beira, Ela se derramando inteira feito feiticeira , feito fêmea donzela princesa, Me recebendo inteiro dentro dela como a terra tão fêmea se arregaça pra foice sementeira, Era minha chuva sagrada feito lágrimas de amor e porra de uma orgia inteira dentro dela feito amazonas feito toda mulher que morre de amor mesmo que viva como guerreira.
Estou bordando com a linha mais grossa o nosso encontro. Bordando com as próprias mãos, herança das avós, das tardes melancólicas de nossa pequena casa, de nossa pequena vila, nosso pequeno logradouro.
São pontos desenhando as palavras, tramas tecendo os sentimentos, remendos no coração, nessas horas desmanchando tudo, trocando de agulha, de linha, de cor, começo de novo. Os rasgos na alma deixarei assim mesmo.
Meu ofício é tear, tanto o que digo quanto o que penso e sinto. Atar nossos corpos na hora do gozo, mas com a linha mais tênue, feito uma viúva negra que devora o macho depois da cópula.
Eu vou abraçar a sua barriga imensa como quem abraça o mundo, seu mundo novo, e os seus seios vão se encher de leite pra desmamar seu bezerro, tanta fartura no teu seio para saciar sua fome, seu amor de filhote, esse agarro de ternura em teu colo, esse amor de tudo te mamando, às vezes ele aperta com os lábios seu mamilo, viu ? Mas você nem vai ralhar com ele...
E você vai estar linda com aquela barriga imensa, uma lindeza de fêmea toda prenha, os olhinhos brilhando tanto que vai alumiar o teu céu acima, teu chão abaixo que nem labareda, teu horizonte feito uma farol para quem espera no mar um resgate.
Tua beleza de mulher vai explodir feito um sol novo nascendo no cosmos.
Você vai dormir de lado, vai dormir de costas, vai dormir pouco, vai dormir na rede, vai querer dormir mais um pouco, vai querer dormir.
E você parir de cócoras feito uma índia, parir na água feito as mães d'água, vai sentir as dores mais lindas do mundo, as dores do parto. Vai abraçá - lo pela primeira vez em sangue e lágrimas, teu rebento, te lambuzar nele todo, vai comer sua própria placenta, vai dilatar tua buceta pra descer do céu tua vida de novo, teu novo sorriso, tua nova alegria, tua nova identidade, exaltando tua divindade fêmea, toda mãe é um cosmos, um rio de três margens, um mar da Bíblia.
Eu vou abraçar tua barriga imensa, a casa da tua borboletinha, o casulo do teu voar infinito, feito um chapéu da lua.
Me sinto livre entre os loucos, entre os encarcerados, os proscritos, me sinto bem entre os malditos, entre aqueles sobre quem recaem as maldições hereditárias, tenho uma empatia profunda pelos que perderam tudo, por quem nunca conheceu o próprio pai, ou por quem perdeu a mãe ainda cedo, e ama os bichos como se fossem sua própria família de sangue.
(Trilha sonora)
Entre os loucos o meu inferno é colorido, entre suas cabeças ocas e suas línguas enroladas de Gardenal, dentro de seus irritamentos internos, suas irritâncias, suas bocas tortas, suas retinas feito as janelas embaçadas de almas em tormento, entre os loucos o meu cantar é de alguma esperança, às vezes o meu andar é fúnebre e arrastado feito um deles, às vezes o meu delírio é tamanho que tenho medo de mim mesma, e minha dor muitas e muitas vezes é inconsolável, que só com um corte profundo na minha carne, somente com minha integridade física mutilada, só fazendo escorrer meu próprio sangue com um talho nas veias é que esqueço do que não pode ser esquecido, como uma dor escrita na alma com um fogo eterno da danação, um cárcere privado em mim.
(Trilha sonora)
A catarse é um valão a céu aberto, uma fratura exposta de nossas frustrações, é quando a gente acorda só pra cuspir e deita de novo mas não dorme, uma cova rasa com as aves negras famintas pelos nossos restos, uma ferida que o cão não lambe, um medo de altura só por estar de pé, por isso rastejamos para não cair, a catarse é teu lixão, teu esgoto pessoal, tua morbidez, tuas derrotas obesas, um ataúde na tua justa medida, teu cofre de misérias arrombado.
E eu tenho muito medo da delinquência acadêmica dos psiquiatras. As psicólogas me são indiferentes, com suas doces ignorâncias. E da ciência tenho traumas horríveis, tenho cicatrizes com nome e sobrenome de suas autorias, a autoridade médica na maioria das vezes é uma invasão de território. Uma arma química de destruição em massa, sobre a horda alucinada dos loucos e alienados. O fármaco é a moeda do psiquiatra. O surto é sua banca de negócios. O louco é uma margem de lucro para os escravocratas.
(Trilha sonora)
Mas a loucura não é nada romântica, são dezessete facadas na própria barriga para ostentar o sofrimento, uma escrita em garranchos analfabetos no próprio corpo com sangue e perplexidade, um poema ogro sobre sua dor.
(Trilha sonora)
Flores raras da morte, que nascem quando morre alguém no seu coração, ou quando todos os amores morrem no seu coração, quando morre toda forma de vida numa terra, um holocausto num pedaço de chão, um pedaço de pão que se nega, uma mendiga velha e louca que você quase se torna, quando não sobra nada nem mesmo uma migalha miserável, nascem assim as flores raras da morte, nascem tortas, entregues, quase uma hoste de espinhos e pétalas estranhas, flores raras da morte nascem nos hospícios, nos manicômios, no seio das famílias, flores raras da morte exalam seus odores que não são perfumes e intrigam as almas nunca distraídas.
A loucura nasce como uma flor rara da morte, cujas raízes, deitam - se entranhadas pela sua alma feito mármore lápide.
Um Dante preso no inferno mais abissal, não o Dante da Divina Comédia inteira, mas o Dante só do inferno, escrito por suas próprias mãos, um sofrimento na alma que cava um abismo profundo entre você e seu próprio corpo, um inferno Dantesco, um monstro épico no espelho do banheiro, um Fausto habitando também na sua co - morbidade, uma insanidade às claras na sala de jantar, na sala de aula, na sala de espera da consulta, um corpo para ser expurgado do seu sofrimento interior, uma paisagem de dor infinita, sem água potável.
(Trecho de Os Cárceres, texto, dramaturgia e trilha sonora original de Marcabru Aiara)
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